terça-feira, 26 de março de 2013

"O Chipre e nós"

Artigo de Manuel Alegre
O Chipre e nós
26-03-2013 Manuel Alegre, jornal i

Estamos como aqueles prisioneiros dos campos de concentração que viviam na ilusão de que a vez deles talvez não chegasse, enquanto os outros iam sendo encaminhados para as câmaras de gás. Não se vê nenhuma cruz gamada, não há soldados a gritar ordens, a frase Arbeit macht frei ainda não aparece à entrada do nosso país.

 
Mas o ministro Schaulbe, Durão Barroso e os donos da Europa germanizada metem medo. Não precisam de invadir nem de bombardear. Tomam um decisão e exterminam um país. Ontem foi o Chipre. Os quinta colunas que governam os países europeus e os comentadores arregimentados acham que não se pega, o Chipre é um pequeno país. Já tinham dito o mesmo da Grécia. Enquanto não nos puserem uma marca na lapela, eles julgam que vamos escapar. Mas eu já estou a sentir-me condenado. Não consigo deixar de me sentir cipriota. Estava convencido que pertencíamos à União Europeia, um projecto de prosperidade partilhada entre estados iguais e soberanos. Mas o Chipre, depois da Grécia e, de certo modo, nós próprios, fez-me perceber que esta Europa é uma fraude. Deixou de ser um projecto de paz e liberdade, começa a ser uma ameaça de tipo totalitário, com o objectivo de empobrecer e escravizar os países do sul. Por isso é conveniente que nos sintamos todos cipriotas. Antes que chegue a nossa vez.
 

domingo, 24 de março de 2013

"Agarrem-me se não eu bato-lhe!"

"Ao contrário do que seria de esperar, e não deixa de ser paradigmático dos tempos que vivemos, as últimas sondagens demonstram à saciedade que a oposição, sobretudo a do “arco do poder”, continua sem capitalizar a seu favor o descontentamento colectivo pelo estado calamitoso a que o nosso país chegou.

As respostas a este paradigma são diversas e encontram fortes razões em fenómenos sociológicos e políticos de natureza vária.

A uma cultura cívica de reduzida exigência em relação aos políticos e às instituições, de insipiente contestação popular, de reduzida expressão e participação eleitoral e política da esmagadora maioria da sociedade civil, poderemos juntar realidades tão simples e evidentes como a falta de entendimentos à esquerda, a cumplicidade de todos (embora em graus diferenciados) no estado da nação, a falta de classe das lideranças políticas, a teia de cumplicidades entre o estado e a economia pseudo-liberal, e por aí adiante.

Há contudo para mim uma causa que se sobrepõe a todas as outras e mede-se em quilogramas, ou fracção desta objectiva unidade de medida. Refiro-me obviamente ao tamanho (peso) dos tomates.

É claro que a decisão de apresentação de uma moção de censura, que o emérito Seguro fez ontem aprovar em conclave extraordinário, se destina mais à ovação interna do que ao legítimo e urgente exercício de uma alternativa de esperança. É fácil trocar palmadinhas nos Costas por gestos inconsequentes e redundantes, face há realidade nua e crua de um hemiciclo que maioritariamente defende um governo incompetente, que vê no Estado um papel meramente assistencialista e de pseudo-regulação. Porque se o emérito realmente tivesse vontade (e capacidade) para mudar o estado das coisas, exporia toda artilharia em cima da banca e indicaria de forma clarividente o que faria de modo diferente, para além das intenções genéricas de “negociação com a troika” e de “adopção de medidas para o crescimento” que vai apregoando com olhar vago e mortíço. Mas quais e como? Qual a estratégia? Aliás, a tibieza é tal que à complexidade da pergunta - “E promoveria a descida dos impostos?” - Seguro responde com clareza sintomática - “Não me comprometo”.

E no fim de tudo isto perguntar-me-ão: mas Seguro é papável? Obviamente que sim, em função da posição anedoticamente incontestada que ocupa no seu partido e da benção que os Espírito Santo e toda a nação de anjos e arcanjos calmamente instalados na banca celestial lhe parecem reservar, face às investidas brincalhonas dos Costas. Mas claramente que não, em função da falta de qualidades políticas que demonstra e da exígua falta de peso da fruta. As sondagens demonstram-no de forma evidente. Seguro não é papável porque este tipo de produtos são facilmente perecíveis e por isso mesmo de curtíssimo prazo de validade.

Mas duma coisa estou certo, embora a validação dessa convicção esbarre na impossibilidade de o provar. Se a moção de censura tivesse consequências traduzidas na queda do governo, Seguro jamais a apresentaria. É por isso que eu estou farto de líderes com tomates cherry".

terça-feira, 19 de março de 2013

Pai! Afasta de mim esse “cale-se”


A música "Cálice", de autoria de Chico Buarque e Gilberto GIl, foi considerada subversiva pelos órgãos da ditadura militar brasileira e por isso teve que ser cantada com a letra modificada. As lembranças da repressão; a prisão de pessoas que simplesmente "sumiam"; a violência sofrida pelos que desafiavam o regime repressor - tudo isso atingia a todos que não pactuavam com o regime militar instalado no Brasil pós-64. Um grande "CALE-SE" se abateu sobre o povo brasileiro.

terça-feira, 12 de março de 2013

"Ei-los que partem novos e velhos"


Há canções que nos marcaram. Há letras de canções que nunca pensámos que nelas um dia nos iriamos rever. Acontece!

sexta-feira, 8 de março de 2013

Esta Gente / Essa Gente

O que é preciso é gente
gente com dente
gente que tenha dente
que mostre o dente

Gente que não seja decente
nem docente
nem docemente
nem delicodocemente

Gente com mente
com sã mente
que sinta que não mente
que sinta o dente são e a mente

Gente que enterre o dente
que fira de unha e dente
e mostre o dente potente
ao prepotente

O que é preciso é gente
que atire fora com essa gente

Essa gente dominada por essa gente
não sente como a gente
não quer
ser dominada por gente

NENHUMA!

A gente
só é dominada por essa gente
quando não sabe que é gente

Ana Hatherly, in "Um Calculador de Improbabilidades"

Dia Internacional da Mulher

Reeditado porque faz todo o sentido.

Neste dia, do ano de 1857, as operárias têxteis de uma fábrica de Nova Iorque entraram em greve, ocupando a fábrica, para reivindicarem a redução de um horário de mais de 16 horas por dia para 10 horas. Estas operárias que, nas suas 16 horas, recebiam menos de um terço do salário dos homens, foram fechadas na fábrica onde, entretanto se declarara um incêndio e 130 morreram queimadas.

Em 1910, numa conferência internacional de mulheres realizada na Dinamarca, foi decidido, em homenagem àquelas mulheres, comemorar o 8 de Março como "Dia Internacional da Mulher".

Infelizmente, 155 anos depois faz todo o sentido comemorar esta data e recordar aquele trágico acontecimento, pois "vemos ouvimos e lemos" que em grande parte do nosso planeta continuam a existir formas de exploração deploráveis onde as mulheres continuam escravizadas.

Nos tempos que correm poderemos interrogar-nos, se faz sentido dirigir a luta em defesa das mulheres quando há formas de exploração barbara que atingem de igual modo, homens e  crianças.

Em Portugal a luta de mulheres e homens (embora subsistam formas de exploração encapotadas, que competem com muitas das situações que se conhecem por esse mundo fora.) passa duma forma assustadoramente crescente, pura e simplesmente pelo direito ao trabalho com uma remuneração digna e pelo respeito pelos mais elementares direitos consignados na constituição da Republica Portuguesa.


Para as mulheres do meu País e do mundo inteiro deixo uma canção cantada por outra mulher que aqui recorda uma parte da história trágica de um outro País

Não apaguei os comentários feitos há um ano atrás por me parecer não ser correcto.

quinta-feira, 7 de março de 2013

O MEU AMIGO MATOU-SE


 

O MEU AMIGO MATOU-SE


É um dos motivos porque vou à manifestação do dia 2 de Março.
Vou também em nome do meu amigo. No dia 18 de Fevereiro o meu amigo J. C. deu um tiro na cabeça. Já não vai a esta manifestação.
Era um indigente ou um faminto? Não. Era um exemplo da chamada classe média. Gostava da vida. De comer, de dançar, de ir à praia. Ele e a mulher comportavam-se como dois namorados, depois de todos estes anos. Gostava dos filhos, a quem era muito chegado, gostava da neta. Gostava do trabalho. Mas, a situação a que nos levaram criou um labirinto sem saída. De facto, sem saída para uma grande parte da população. Deixemo-nos de flores, de «há soluções para tudo», de «é preciso ter esperança» ou de «há-de correr bem».
Há certas situações que não têm solução à vista. Tinha os pais em casa com oitenta e tal anos e tinham chegado ao ponto de não conseguirem tratar de si próprios. Solução? Um «lar» custa 1300 euros para cada um. Uma empregada permanente anda por aí.
Tinha empregados a quem tinha que pagar salários todos os meses. Tinha empréstimos ao banco, crédito a cumprir, letras. Tinha clientes que não pagavam, porque por sua vez não lhes pagavam a eles.
Os filhos trabalhavam, mas havia um apoio indispensável, por causa da precariedade e por causa de situações de doença.
O senhorio acabava de, em concordância com a nova lei das rendas, passar-lhe a renda para o dobro.
Tinha solução para esta espiral que todos os dias se agravava? Não tinha.
Declarava insolvência, renunciava a todos os pequenos bens, ia para a rua, abandonava pais e filhos ao destino? Claro, tudo é possível.
Mas a dignidade tem um preço.
Os amigos podiam ajudar? Muito pouco.

Foi com certeza em nome da dignidade que teve a coragem de acabar com a vida.
Nesse mesmo dia veio ter ao Serviço de Urgência do Hospital de Santa Maria uma senhora que se atirou para debaixo do comboio do Metro. Salvaram-na, mas ficou sem um braço. Dias antes atirara-se a professora e o filho de uma janela em Bragança. Na ponte da Arrábida são frequentes os ajuntamentos porque alguém se atirou.
Estamos a assistir a uma epidemia?
Como os nossos governantes e as estruturas internacionais e o poder financeiro mundial já não distinguem entre o Bem e o Mal, temos nós que desobedecer às leis do Mal, protestar, mas não só. Encontrar o caminho para derrubar este Poder. No dia 2 de Março o meu caminho começará na Maternidade Alfredo da Costa na Maré Branca e continuará com todos os outros, através de Lisboa.
Também em nome do meu amigo que NÃO AGUENTOU.

quarta-feira, 6 de março de 2013

"A Vida Está Acima da Dívida"

"A mãe de todas as mensagens das manifestações do passado fim de semana foi a afirmação da vida contra a morte. Uma afirmação com três nomes: dignidade, democracia e patriotismo. E uma canção, onde coube todo o país exceto o governo. Sentindo um perigo e uma ameaça viscerais, os portugueses recusam-se a deixar de gostar de si e do seu país. Vivem um momento de intensa inteligência intuitiva que está além e aquém do que os discursos e representações oficiais dizem deles. Recusam-se a aceitar que uma vida honesta feita de muito trabalho e estudo possa ser apelidada de preguiçosa, leviana e aventureira, que os impostos e os descontos pagos ao longo da vida tenham sido em vão, que quem menos pagou seja quem é mais protegido num momento de dificuldade coletiva. Recusam-se a aceitar que a democracia seja uma máquina de triturar a esperança, um moinho que só sabe moer o moleiro, uma farsa onde só são reais os fios que sustentam as marionetas, uma engrenagem encalhada num parlamento à beira-mar enterrado. Recusam-se a aceitar que os representantes eleitos pelo povo representem exclusivamente os interesses de credores predadores, que os governantes tenham outra pátria que não a dos governados, que a riqueza do país e o bem-estar dos cidadãos se transformem em penhora de um futuro hipotecado, que o roubo deixe de o ser apenas por estar institucionalizado e cotado internacionalmente. Recusam-se a aceitar que um governo nacional se comporte como a comissão liquidatária do país, reduza a história e a cultura a números, de que aliás retira tantas previsões quantas imprevisões, viaje às escondidas pelo país e só fale em público quando o público é estrangeiro.

Esta inteligência intuitiva, que afirma a dignidade, a democracia e o patriotismo, permite entender o que parece inexplicável: que o governo seja indigno, apesar de ocupar instituições dignas; antidemocrático, apesar de ter sido eleito democraticamente; e antipatriótico, apesar de se dizer nosso ante outros países. A inteligência intuitiva não dispensa razões nem desconhece riscos, mas tem com umas e outros uma relação indireta ou fractal. Tem assim uma leveza traiçoeira que torna o seu tratamento político complexo. Eis algumas das razões. Cerca de 20% da receita fiscal vai para pagar juros (por cada 100 euros, 20 vão para os credores); pagamos em juros mais do que gastamos com a educação (108%) e 86% do que gastamos com a saúde; os juros representam 15% da despesa efetiva total do Estado; a política de austeridade aniquila os devedores até ao ponto de nada mais lhes poder tirar senão a vida nua que ainda lhes restar; se propuséssemos uma renegociação da dívida e não pagássemos juros durante o período de negociação (moratória), o nosso orçamento estaria equilibrado e seria possível libertar recursos para investimento e criação de emprego.

Quais os riscos? Se a política atual se mantiver, os portugueses passarão os próximos trinta anos a transferir a sua poupança para o exterior; com o ritmo migratório de 40.000 pessoas por ano, na grande maioria jovens e muitos deles altamente qualificados, daqui a dez anos Portugal será um imenso deserto com balões Google de resorts para turistas. Mais do que riscos, estas são certezas. Contra elas, há que ponderar os riscos da moratória. Portugal ficará sem acesso aos mercados? Mas não é esta a situação atual? O que aconteceu com a Islândia? Os credores, confrontados com uma ameaça credível de moratória, serão rígidos ou negociarão receber alguma coisa em vez de nada? A UE deixará cair definitivamente a periferia, como tem vindo a fazer, ou entenderá finalmente que a crise do sul da Europa só é grave porque há um norte que se alimenta dela e dispõe de uma moeda apenas coerente com a sua economia? Ante riscos de desastre e certezas desastrosas, a inteligência intuitiva não hesita.

O hino à vida que se ouviu pelo país inteiro foi uma moção popular pela demissão do governo. Parafraseando o que Humberto Delgado disse sobre o que faria de Salazar se ganhasse as eleições: obviamente, demitam-se!"

A Vida Está Acima da Dívida
Boaventura de Sousa Santos

Crónica | Visão 7 Março 2013

segunda-feira, 4 de março de 2013

Deolinda - 'Seja Agora' (2013)


SEJA AGORA
Nós havemos de nos ver os dois
ver no que isto dá
ficar um pouco mais a conversar
Ter a eternidade para nós
Quem sabe, jantar,
Se tu quiseres pode ser hoje

Tem de acontecer, porque tem de ser
e o que tem de ser tem muita força
E sei que vai ser, porque tem de ser
Se é pra acontecer, pois que seja agora

Nós havemos ambos de encontrar
um destino qualquer
ou um banquinho bom para sentar
Vai ser tão bonito descobrir
que no futuro só
quem decide é a vontade

Tem de acontecer, porque tem de ser
e o que tem de ser tem muita força
E sei que vai ser, porque tem de ser
Se é pra acontecer, pois que seja agora

Tem de acontecer, porque tem de ser
e o que tem de ser tem muita força
E sei que vai ser, porque tem de ser
Se é pra acontecer, pois que seja agora

Que seja agora
Que seja agora
Se é pra acontecer
Pois que seja agora

Que seja agora
Que seja agora
Se é pra acontecer
Pois que seja agora

Que seja agora
Que seja agora
Se é pra acontecer
Pois que seja agora

Que seja agora
Que seja a hora
Se é pra acontecer
Pois que seja agora!

sábado, 2 de março de 2013

Por aqui foi assim...

foto surripiada ao grupo da Marinha Grande (via facebook)
 
Não fomos muitos, mas numa Cidade com cerca de 30.000 habitantes 10% estavam lá.
Notava-se sobretudo uma forte tristeza nos rostos com que me fui cruzando. Não podemos deixar que nos roubem até a capacidade de esboçar um simples sorriso, hoje senti isso.
Quando já nada tivermos a perder o que é que estamos dispostos a fazer?